Corpo e Sangue da nova aliança: Deus fez
aliança com Israel ao libertá-lo do Egito. Esse pacto foi instituído por meio
de um rito. Primeiramente, o sangue do cordeiro foi derramado em substituição
da vida dos primogênitos hebreus. Depois o rito continuou na celebração de uma
refeição, a ceia pascal, memorial de libertação, celebrada a cada ano pelos
filhos de Israel para atualizar aquele evento fundador e paradigmático da religião
bíblico-judaica.
Comentário dos textos bíblicos
No Oriente antigo, o sangue simbolizava a
totalidade da vida de um ser, animal ou humano. Por isso, quando o sangue de um
animal era oferecido a Deus, na verdade o que se ofertava era a vida da pessoa
que fazia a oferenda.
O termo sacrifício significa “tornar
sagrado”; portanto, quando o sacerdote colocava o sangue do animal sobre o
altar, a vida da pessoa ofertante é que se tornava sagrada, ou seja, consagrada
a Deus. A ideia de “Sacrifício” não tinha a atual conotação de “realização de
algo difícil ou penoso”, mas de santificação ou sacralização da vida.
Antes de derramar o sangue na cruz, Jesus
fez de sua vida uma oferta a Deus e à humanidade. Por isso ele antecipa, no
gesto profético da última ceia, o que se dará no momento culminante do dom de
si mesmo, a morte na cruz. É por causa de uma vida inteira ofertada, a Deus e
ao outro, que a morte de Jesus, cume dessa oferta, pode ser chamada de
sacrifício. A vida inteira de Jesus é sacrifício, é uma vida consagrada,
santificada. Jesus oferta a própria vida como nosso representante.
Sua obediência e fé integral nos substituem,
já que não conseguimos ser obedientes e fiéis da mesma forma. Sua vida humana
sem pecados nos liberta do pecado, sua ressurreição nos liberta da morte. Em
tudo isso Jesus nos representa e nos substitui. Cessam daqui por diante os
antigos sacrifícios de animais. O sangue, a vida ofertada da nova aliança é o
que vigora doravante.
As palavras do Senhor: “Isto é o meu
corpo... isto é o meu sangue”, “tomai e comei... tomai e bebei”, deveriam nos
recordar de que nos compete assimilar em nossa vida as características da vida
de Jesus.
Dessa forma, no Corpo e Sangue de Cristo vive
e cresce a Igreja, com os fiéis continuamente se alimentando de amor, de
fidelidade, de doação ao outro, de perdão e de todos os aspectos de vida de
Jesus.
O Corpo e sangue de Cristo são centro e
sustentáculo da vida cristã. Por isso, quem deles se alimenta há que aceitar
participar da doação de vida realizada por Cristo, em adesão à vontade do Pai e
em doação ao próximo. Assim, por meio da Eucaristia, os fiéis vivem o mistério
da vida, morte e ressurreição de Cristo, celebrando agora a comunhão sem fim na
glória eterna.
A expressão “sangue da aliança” remete a
Êxodo 24,8, à aliança no Sinai selada com o sangue de animais. O profeta
Jeremias anunciou a nova aliança (Cf. Jr 31,31-34), que foi selada
definitivamente em Cristo “pela oferenda do corpo de Jesus Cristo, perfeita e
realizada de uma vez por todas” (Cf. Hb 10,10). O “sangue derramado em favor de
muitos” alude, de modo especial, a Isaías 53,12 e indica que Jesus é o Servo
sofredor por excelência, que entrega a vida pela salvação da humanidade. A
Eucaristia torna-se o memorial da nova aliança, plenificada na morte redentora
de Cristo.
A leitura do livro do Êxodo descreve a
conclusão da aliança no Sinai entre Deus e o povo. Moisés, depois de fazer a
experiência do encontro com o Senhor (19,3;24,1-2), reúne o povo e comunica
“todas as palavras e todos os decretos do Senhor” (24,3). Trata-se
especialmente dos dez mandamentos (20,1-21) e do código da aliança
(20,22-23.33). O povo compromete-se a seguir o caminho da aliança, que
proporciona a comunhão com Deus e entre si: “Faremos tudo o que o Senhor nos
disse” (24,3).
O salmo 115 (116) é uma oração de louvor e
ação de graças ao Senhor, pois foram quebradas as cadeias da opressão. O
salmista ergue o cálice da salvação e invoca o nome do Senhor, como sinal de
compromisso.
A leitura da carta aos Hebreus acentua que
Cristo ressuscitado é o novo sacerdote, que entrou no santuário através da
tenda maior e mais perfeita. Com a única oferenda de si mesmo, levou à
perfeição para sempre os que Ele santifica (Cf. 10,14), superando os
sacrifícios antigos.
Como a conclusão da aliança se realizava
mediante a efusão de sangue (Ex 24.6-8), a nova aliança revela-se plenamente na
morte redentora de Cristo em favor de toda a humanidade. Assim, Cristo é
ressaltado com “mediador da nova aliança” (9,15).
Ligando a Palavra com a ação eucarística
A Eucaristia é o memorial do mistério pascal
de Cristo, sela paixão, morte e ressurreição. Deus sela a aliança eterna e
definitiva com a humanidade através da oferenda única e perfeita de Jesus (Hb
10,10-18), que é atualizada na liturgia por meio da ação do espírito Santo. Ao
comungarmos do corpo e sangue, em cada celebração, “estaremos proclamando a
morte do Senhor, até que Ele venha” (1 Cor 11,26), comprometidos a formar o autêntico corpo eclesial.
Esta Solenidade faz eco da celebração de
Quinta-feira Santa e nos faz reviver os mesmos acontecimentos de forma mística
e concreta: celebramos o mistério da entrega do Senhor Jesus.
A Eucaristia é o memorial perene de Sua
Paixão, o cumprimento perfeito das figuras da Antiga Aliança e o maior de todos
os milagres de Cristo.
Luis Filipe Dias |
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