sábado, 24 de fevereiro de 2018

“Jesus transfigurou-se diante deles” Mc 9, 2b (25/02/2018)

No segundo Domingo da Quaresma, a Palavra de Deus define o caminho que o verdadeiro cristão deve seguir para chegar à vida nova: é o caminho da escuta atenta de Deus e dos seus projetos, o caminho da obediência total e radical aos planos do Pai. O Evangelho nos fala da transfiguração de Jesus.

Leitura do Livro do Gênesis: (Gn 22,1-2.9a.10-13.15-18)
Naqueles dias, 1Deus pôs Abraão à prova. Chamando-o, disse: “Abraão!” E ele respondeu: “Aqui estou”. 2E Deus disse: “Toma teu filho único, Isaac, a quem tanto amas, dirige-te à terra de Moriá e oferece-o aí em holocausto sobre um monte que eu te indicar”. 9Chegados ao lugar indicado por Deus, Abraão ergueu um altar, colocou a lenha em cima, amarrou o filho e o pôs sobre a lenha em cima do altar. 10Depois, estendeu a mão, empunhando a faca para sacrificar o filho. 11E eis que o anjo do Senhor gritou do céu, dizendo: “Abraão! Abraão!” Ele respondeu: “Aqui estou!” 12E o anjo lhe disse: “Não estendas a mão contra teu filho e não lhe faças nenhum mal! Agora sei que temes a Deus, pois não me recusaste teu filho único”. 13Abraão, erguendo os olhos, viu um carneiro preso num espinheiro pelos chifres; foi buscá-lo e ofereceu-o em holocausto no lugar do seu filho. 15O anjo do Senhor chamou Abraão, pela segunda vez, do céu 16e lhe disse: “Juro por mim mesmo – oráculo do Senhor –, uma vez que agiste desse modo e não me recusaste teu filho único, 17eu te abençoarei e tornarei tão numerosa tua descendência como as estrelas do céu e como as areias da praia do mar. Teus descendentes conquistarão as cidades dos inimigos. 18Por tua descendência serão abençoadas todas as nações da terra, porque me obedeceste”. – Palavra do Senhor. – Graças a Deus.

A primeira leitura nos apresenta a figura de Abraão, homem de fé que vive numa constante escuta de Deus, que aceita os apelos de Deus e lhes responde com obediência total, mesmo quando os planos de Deus parecem ir contra os projetos e sonhos pessoais. Abraão segue os projetos de Deus de todo coração, é para nós modelo a ser seguido. Para Abraão nada mais conta quando estão em jogo os planos de Deus. Na vida dos homens nos dias de hoje, nem sempre Deus ocupa o lugar central, com frequência, o dinheiro, o poder, a posição social, a carreira profissional, o sucesso, ocupam o lugar de Deus, nossos interesses, os valores que nos orientam, nos condicionam nossas opções. Mas Abraão, o crente fiel, é fundamental a obediência e convida-nos, nesta quaresma a rever nossas prioridades e dar a Deus o lugar que Ele merece.

Salmo (Sl 115)
Andarei na presença de Deus, junto a ele na terra dos vivos.
Guardei a minha fé, mesmo dizendo: “É demais o sofrimento em minha vida!” É sentida por demais pelo Senhor a morte de seus santos, seus amigos.
Eis que sou o vosso servo, ó Senhor, vosso servo que nasceu de vossa serva; mas me quebrastes os grilhões da escravidão! Por isso oferto um sacrifício de louvor, invocando o nome santo do Senhor.
Vou cumprir minhas promessas ao Senhor na presença de seu povo reunido; nos átrios da casa do Senhor, em teu meio, ó cidade de Sião!

O salmista nos mostra que mesmo sofrendo e passando por dificuldades em nossa caminhada, devemos ter consciência que o Senhor sofre conosco e nos prepara para uma vida de prosperidade. Precisamos cumprir nossas promessas diante do Senhor e diante dos homens, ofertar a Deus um sacrifício de louvor, consiste em dar testemunho do grande amor que Deus tem por cada um de nós.

Leitura da Carta de São Paulo aos Romanos: (Rm 8,31b-34)
Irmãos, 31se Deus é por nós, quem será contra nós? 32Deus, que não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós, como não nos daria tudo junto com ele? 33Quem acusará os escolhidos de Deus? Deus, que os declara justos? 34Quem condenará? Jesus Cristo, que morreu, mais ainda, que ressuscitou e está à direita de Deus, intercedendo por nós? – Palavra do Senhor. – Graças à Deus.

A segunda leitura nos lembra que Deus nos ama com um amor imenso e eterno. A melhor e maior prova desse amor é Jesus Cristo, o filho amado do Pai que morreu para nos ensinar o verdadeiro caminho, sendo assim, o cristão nada tem a temer e temos que enfrentar a vida com serenidade, paciência e confiança. Paulo diz a nós cristãos que devemos ter esperança na ressurreição ou seja o triunfo final.

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos (Mc 9,2-10)
Naquele tempo, 2Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e os levou sozinhos a um lugar à parte sobre uma alta montanha. E transfigurou-se diante deles. 3Suas roupas ficaram brilhantes e tão brancas como nenhuma lavadeira sobre a terra poderia alvejar. 4Apareceram-lhe Elias e Moisés, e estavam conversando com Jesus. 5Então Pedro tomou a palavra e disse a Jesus: “Mestre, é bom ficarmos aqui. Vamos fazer três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias”. 6Pedro não sabia o que dizer, pois estavam todos com muito medo. 7Então desceu uma nuvem e os encobriu com sua sombra. E da nuvem saiu uma voz: “Este é o meu Filho amado. Escutai o que ele diz!” 8E, de repente, olhando em volta, não viram mais ninguém, a não ser somente Jesus com eles. 9Ao descerem da montanha, Jesus ordenou que não contassem a ninguém o que tinham visto, até que o Filho do homem tivesse ressuscitado dos mortos. 10Eles observaram essa ordem, mas comentavam entre si o que queria dizer “ressuscitar dos mortos”. – Palavra da salvação. – Glória a vós, Senhor.

A transfiguração que Marcos nos relata, no seu evangelho, é mais uma manifestação de Deus aos homens. A transfiguração de Jesus, podemos dizer que foi um prenuncio do seu retorno glorioso para o Pai, assim Ele revela aos discípulos, de forma visível, a sua intimidade com o Pai, assegurando-os da sua ressurreição! Na transfiguração, Pedro, Tiago e João, puderam visualizar o encontro de Jesus com o Pai. Podemos dizer que o Céu veio até eles naquele momento, os discípulos andavam tristes, com as últimas revelações de Jesus, sobre como seria o desfecho de sua trajetória aqui na terra, se encheram de alegria, pois diante de Jesus transfigurado, eles tiveram a certeza de que a vida e a ação de Jesus, não terminariam com a sua morte.

Assim como Pedro desejou construir três tendas para que eles pudessem ficar no alto da montanha com Jesus, longe dos perigos e sem precisar batalhar a vida, nós também, certamente, desejaríamos o mesmo. Essa pode ser a nossa grande tentação dos dias de hoje: buscar a nossa comodidade, o nosso bem-estar, sem pensar na necessidade do outro.  Rezar, ouvir e meditar a palavra, agrada muito a Deus, mas Ele quer que façamos muito mais, Deus quer que desçamos do alto da “montanha”, que voltemos à planície, pois é aqui, neste chão, que Ele quer contar conosco, na construção de um mundo melhor, no amparo a tantos irmãos, desfigurados, vítimas das injustiças sociais, das drogas, do alcoolismo, do desemprego, que impedem muitas vezes de terem uma vida digna. Precisamos sair de nossas tendas, abrir mão da nossa zona de conforto, descruzar os nossos braços, desvendar os nossos olhos e nos pôr à caminho, afinal, há muito o que fazer neste mundo tão desigual, mundo, que a cada dia vai perdendo de vista, o horizonte da paz.

Neste tempo quaresmal, somos convidados a percorrer o caminho que Jesus percorreu, atualizando esta caminhada no contexto do mundo de hoje. É percorrendo o caminho que Jesus percorreu que vamos tomando consciência da grandeza do seu amor, e que é no dia a dia da nossa vida, que devemos responder a este amor sem limites, incondicional, fazendo do seu caminho o nosso caminho. A Quaresma é um período de interiorização da fé, tempo de ouvir mais do que falar. A liturgia deste tempo, nos leva a um retiro interior, a confrontar os nossos comportamentos com a Palavra de Deus, ajustando o nosso viver, aos valores do evangelho. Que a Mãe Santíssima nos ajude intercedendo por nós nesta caminhada. Louvado seja nosso Senhor Jesus!  Paz e bem a todos e todas irmãos e irmãs.
Marlene Coelho Resstel

sábado, 17 de fevereiro de 2018

“O tempo já se completou e o reino de Deus está próximo.” Mc 1, 15a (18/02/2018)

Nesta semana iniciamos o período da quaresma e somos convidados a percorrer junto com Jesus o caminho da sua missão, meditemos sobre aliança que Deus fez com Noé após a saída da arca, aliança essa concretizada em Cristo por sua paixão, morte e ressurreição, Ele se entregou por inteiro a nós e é neste período que nos preparamos para a nossa entrega total ao Reino de Deus.

Na leitura do livro do Gênesis 9,8-15, vemos Deus firmando a sua aliança com Noé.
Leitura do livro do Gênesis: 8Disse Deus a Noé e a seus filhos: 9“Eis que vou estabelecer minha aliança convosco e com vossa descendência, 10com todos os seres vivos que estão convosco: aves, animais domésticos e selvagens, enfim, com todos os animais da terra, que saíram convosco da arca. 11Estabeleço convosco a minha aliança: nunca mais nenhuma criatura será exterminada pelas águas do dilúvio e não haverá mais dilúvio para devastar a terra”. 12E Deus disse: “Este é o sinal da aliança que coloco entre mim e vós, e todos os seres vivos que estão convosco, por todas as gerações futuras: 13ponho meu arco nas nuvens como sinal de aliança entre mim e a terra. 14Quando eu reunir as nuvens sobre a terra, aparecerá meu arco nas nuvens. 15Então eu me lembrarei de minha aliança convosco e com todas as espécies de seres vivos. E não tornará mais a haver dilúvio que faça perecer nas suas águas toda criatura”. – Palavra do Senhor. – Graças a Deus.

Mesmo sendo ridicularizado pelo povo daquela época, Noé ouviu o chamado de Deus para construir a arca, salvando sua família e várias espécies de animais. Com isso Deus fez com ele uma aliança deixando no céu um sinal de sua promessa, um arco que sai da terra passa pelo céu e retorna para terra trazendo as bênçãos de Deus para o seu povo.

O nosso Pai Celeste nos ama e quer que vivamos na alegria como filhos desta aliança, mas infelizmente o povo novamente se perdeu em sua caminhada rumo a morada celeste, hoje vemos muitos conflitos, o povo vive oprimido com a insegurança que assola o nosso mundo e Deus quer contar conosco para a transformação deste mundo, assim como Noé que possamos escutar a voz do Senhor e nos colocar a serviço.

O Salmo 24(25) nos leva a conhecer os caminhos do Senhor, que nos deixemos conduzir pela vossa verdade e vosso amor, é pela sua compaixão que alcançamos a Salvação.
Verdade e amor são os caminhos do Senhor.
Mostrai-me, ó Senhor, vossos caminhos e fazei-me conhecer a vossa estrada! Vossa verdade me oriente e me conduza, porque sois o Deus da minha salvação.
Recordai, Senhor meu Deus, vossa ternura e a vossa compaixão, que são eternas! De mim lembrai-vos, porque sois misericórdia e sois bondade sem limites, ó Senhor!
O Senhor é piedade e retidão e reconduz ao bom caminho os pecadores. Ele dirige os humildes na justiça, e aos pobres ele ensina o seu caminho.


Em sua carta 1 São Pedro 3,18-22 nos mostra a entrega de Cristo para nos resgatar das trevas do pecado.
Leitura da primeira carta de são Pedro: Caríssimos, 18Cristo morreu, uma vez por todas, por causa dos pecados, o justo pelos injustos, a fim de nos conduzir a Deus. Sofreu a morte na sua existência humana, mas recebeu nova vida pelo Espírito. 19No Espírito, ele foi também pregar aos espíritos na prisão, 20a saber, aos que foram desobedientes antigamente, quando Deus usava de longanimidade, nos dias em que Noé construía a arca. Nesta arca, umas poucas pessoas – oito – foram salvas por meio da água. 21À arca corresponde o batismo, que hoje é a vossa salvação. Pois o batismo não serve para limpar o corpo da imundície, mas é um pedido a Deus para obter uma boa consciência, em virtude da ressurreição de Jesus Cristo. 22Ele subiu ao céu e está à direita de Deus, submetendo-se a ele anjos, dominações e potestades. – Palavra do Senhor. – Graças a Deus.

As palavras de São Pedro nos fazem meditar: Que amor tão grandioso que faz um justo dar a vida por tantos injustos? Sim Jesus morreu por todos nós e nos deu o exemplo do caminho a seguir, não devemos pedir a Deus que nos livre dos sofrimentos aqui neste mundo, precisamos clamar ao nosso Pai de misericórdia que nos dê a força e o entusiasmo para vencer os sofrimentos desta vida, olhando para Nosso Senhor Jesus Cristo no alta da cruz sabemos que Ele deu a vida por nós, mas que também ressuscitou para que com Ele a nossa esperança ressuscitasse.

O apóstolo faz uma clara ligação entre os que foram salvos pela arca de Noé e os que são chamados a santidade pelo batismo, não se trata de lavar a imundície do corpo pecador, mas é um convite a uma profunda transformação de vida, os que saíram da arca foram chamados a construir um mundo melhor e nós no batismo somos corresponsáveis na construção do Reino de Deus.  

No evangelho segundo São Marcos 1,12-15, ouvimos do Senhor um convite a conversão.
Proclamação do evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos: Naquele tempo, 12o Espírito levou Jesus para o deserto. 13E ele ficou no deserto durante quarenta dias e aí foi tentado por satanás. Vivia entre os animais selvagens, e os anjos o serviam. 14Depois que João Batista foi preso, Jesus foi para a Galileia, pregando o evangelho de Deus e dizendo: 15“O tempo já se completou e o reino de Deus está próximo. Convertei-vos e crede no evangelho!” – Palavra da salvação. – Gloria a Vós Senhor.

O evangelista nos mostra que Jesus foi conduzido ao deserto onde durante quarenta dias jejuou e foi tentado pelo diabo, também nós somos convidados a nos retirar neste período quaresmal para uma reflexão da nossa caminhada quanto Igreja de Cristo, é preciso reconhecer as nossas faltas e nos preparar para trilharmos os caminhos do Senhor, somos uma Igreja feita de humanos pecadores, mas instituída por origem divina, a Igreja fundada por Cristo e entregue a Pedro para ser o continuador da missão de Nosso Senhor.

Ao saber da prisão de João Batista, Jesus foi para a Galileia anunciando o Reino de Deus e convidando a conversão, “O tempo já se completou e o reino de Deus está próximo. Convertei-vos e crede no evangelho!” Conversão não é um leve ajuste de direção, conversão significa parar a sua trajetória e mudar completamente de direção, esta mensagem de Jesus é muito atual, hoje em meio a tantas violências que este mundo nos impõe somos chamados por Ele diariamente para ser os anunciadores do seu Reino e instrumentos para a conversão do mundo, os apóstolos entenderam a sua mensagem e se entregaram por completo a esta missão. E nós, como estamos respondendo o chamado de Nosso Senhor?

Este ano a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) nos propõe um tema desafiador para a Campanha da Fraternidade “Fraternidade e superação da violência” e tendo como lema “Vós sois todos irmãos”, sim meus irmãos neste Ano do Laicato somos chamados a ser fermentos na massa e dar a nossa contribuição como leigos engajados na missão de Jesus, missão essa que hoje nos chama a superação da violência que esta institucionaliza em nossa sociedade.

Vemos o quanto a população sofre com a falta de segurança e muitas vezes como reféns do tráfico e do crime organizado, triste é saber que em nosso país o crime tem fama de organizado enquanto falta uma ordem no enfrentamento destes crimes, uma sociedade em que ver com normalidade más condutas de pequenas expressões, hoje se choca ao se deparar com a corrupção institucionalizada e quem mais sofre são os que nesta sociedade não tem voz nem vez, em nome da manutenção de privilégios da classe dominante, estão delapidando com os direitos trabalhista e previdenciários do povo, Nosso Senhor Jesus Cristo nos chama para transformar esta triste realidade.

Que nesta quaresma possamos, como Noé, ouvir a voz de Deus e fazer o que é correto e o que nosso Pai espera de nós, hoje somos chamados a renovar esta aliança com Deus, Ele nos deu seu Filho Unigênito como vítima expiatória de nossos pecados, sim Nosso Senhor Jesus Cristo se entregou por nós e neste período temos a oportunidade de meditar sobre a sua vida e missão, contemplar a sua paixão, morte e ressurreição, entregando a nossa vida em missão, como fez Nossa Senhora ao dar o sim ao Anjo Gabriel, que também possamos dar este sim ao anuncio do Reino de Deus e sejamos instrumentos do Senhor para a conversão do mundo, mas esta conversão deve começar dentro de nós para que assim possa alcançar a cada irmão e cada irmã.

Em Jesus e Maria.
Rubens Corrêa


terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

Eis o tempo de Conversão (14/02/2018)

A Quarta-feira de Cinzas marca o início da Quaresma, tempo esse de conversão e mudança. Na liturgia deste dia, somos marcados com o sinal das cinzas com tais palavras: “Convertei vos e credes no evangelho”.

Esse sinal é para nós um lembrete de nossa pequenez e de como somos limitados, recorda-nos, também, que do pó viemos e a ele vamos voltar; mais do que materiais ou carnais, somos espirituais, e que buscamos o Eterno, e não o passageiro, o que passa.

Contudo, como podemos daqui alcançar as coisas celestes? O profeta Joel nos mostra e consegue nos aproximar desse desejo do céu:

“Voltai a mim de todo o coração com jejuns, lágrimas e gemidos de luto...Voltai ao Senhor porque ele é bom e compassivo”.

As palavras do profeta, vão também ao encontro da espiritualidade quaresmal apontando a nós uma volta sincera e arrependida a Deus, por meio da vivência de práticas espirituais, que são pilares cristãos: o jejum, a esmola (caridade) e a oração.

Essas práticas, se vividas de forma verdadeira, inculcam em nossa alma um novo vigor e disposição, o que requer uma radicalidade e um firme propósito. A Quaresma é, pois, tempo propício de escuta de Deus, arrependimento de nossos pecados, tempo de olhar nossas fraquezas para abandonar tudo que impeça que nossa vida seja uma irradiação da face de Jesus Cristo, deixando que Ele mesmo guie a caminhada em nosso deserto pessoal.

Essa preparação para a Páscoa de Jesus requer, portanto, que cada um de nós entendamos por completo o ser Cristão. Viver a Quaresma é, por conseguinte: reconhecimento dos pecados, arrepender-se verdadeiramente, e continuar a caminhar junto ao Cristo. Numa palavra: conversão!

Num de seus escritos Santa Teresa de Jesus exprime de forma concreta a conversão e o seguimento daquele que é transformado e opta por Jesus.

“De ora em diante para vos imitar de algum modo Senhor, quero padecer todos os sofrimentos que me sobrevierem, e tê-los por grande tesouro. Juntos caminhemos, Senhor onde fordes irei eu, por onde passardes hei de passar”.

Que vivamos com fé e esperança esse tempo de graça e de grande crescimento espiritual que é a Quaresma, caminhemos decididamente com este Cristo que sofre, mas que, ao fim, ressuscita a nossa vida por completo.
Marwin Amaral Martins



sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

“Se queres, tens o poder de curar-me” Mc 1, 40b (11/02/2018)

A liturgia do sexto Domingo do Tempo Comum apresenta-nos um Deus cheio de amor, de bondade e de ternura, que convida todos a integrar a comunidade dos filhos de Deus. Ele não exclui ninguém nem aceita que, em seu nome, se inventem formas de discriminação ou marginalização para exclusão de pessoas.

 A leitura do Livro do Levítico (Lv 13,1-2.44-46) apresenta-nos a legislação que definia a forma de tratar com os leprosos.
Leitura do Livro do Levítico: 1O Senhor falou a Moisés e Aarão, dizendo: 2“Quando alguém tiver na pele do seu corpo alguma inflamação, erupção ou mancha branca, com aparência do mal da lepra, será levado ao sacerdote Aarão ou a um dos seus filhos sacerdotes.
44Se o homem estiver leproso é impuro, e como tal o sacerdote o deve declarar. 45O homem atingido por este mal andará com as vestes rasgadas, os cabelos em desordem e a barba coberta, gritando: ‘Impuro! Impuro!’
46Durante todo o tempo em que estiver leproso será impuro; e, sendo impuro, deve ficar isolado e morar fora do acampamento”. – Palavra do Senhor. Graças a Deus.

Os homens inventam mecanismos de discriminação e de rejeição para seu próprio conforto e usam o nome de Deus para que suas vontades sejam aceitas como lei.

O salmo (Sl 31) apresenta a alegria do servo que tem seus pecados perdoados.
Sois, Senhor, para mim, alegria e refúgio.
Feliz o homem que foi perdoado e cuja falta já foi encoberta! Feliz o homem a quem o Senhor não olha mais como sendo culpado e em cuja alma não há falsidade!
Eu confessei, afinal, meu pecado e minha falta vos fiz conhecer. Disse: “Eu irei confessar meu pecado!” E perdoastes, Senhor, minha falta.
Regozijai-vos, ó justos, em Deus e no Senhor exultai de alegria! Corações retos, cantai jubilosos!

 Na leitura (1Cor 10,31-11,1), Paulo procura esclarecer sobre a utilização pelos homens da carne de animais oferecidas em sacrifícios.
Leitura da primeira carta de são Paulo aos Coríntios: Irmãos, 31quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus. 32Não escandalizeis ninguém, nem judeus, nem gregos, nem a Igreja de Deus. 33Fazei como eu, que procuro agradar a todos em tudo, não buscando o que é vantajoso para mim mesmo, mas o que é vantajoso para todos, a fim de que sejam salvos. 11,1Sede meus imitadores, como também eu o sou de Cristo. – Palavra do Senhor. – Graças a Deus.

Diante das dúvidas a respeito das carnes imoladas aos ídolos, Paulo propõe buscar sempre a glória de Deus e o bem das pessoas, sem escandaliza-las. E inclusive se apresenta como exemplo de comportamento, afirmando ser imitador de Cristo.

No Anúncio do Evangelho (Mc 1,40-45), Marcos apresenta a fé do leproso diante de Jesus Cristo.
Proclamação do evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos: Naquele tempo, 40um leproso chegou perto de Jesus e, de joelhos, pediu: “Se queres, tens o poder de curar-me”41Jesus, cheio de compaixão, estendeu a mão, tocou nele e disse: “Eu quero: fica curado!” 42No mesmo instante a lepra desapareceu e ele ficou curado. 43Então Jesus o mandou logo embora, 44falando com firmeza: “Não contes nada disso a ninguém! Vai, mostra-te ao sacerdote e oferece, pela tua purificação, o que Moisés ordenou, como prova para eles!” 45Ele foi e começou a contar e a divulgar muito o fato. Por isso Jesus não podia mais entrar publicamente numa cidade: ficava fora, em lugares desertos. E de toda parte vinham procurá-lo. – Palavra da salvação. — Glória a vós, Senhor.

No Evangelho Marcos diz que Jesus teve compaixão do doente, sem preconceito e sem medo de tornar-se impuro, o mestre estende a mão ao enfermo, levanta-o e devolve-lhe a dignidade.

Nas leituras o leproso era marginalizado e deveria viver fora da cidade, longe do convívio social e religioso, por acreditarem que sua doença era fruto de algum pecado cometido.

A primeira leitura indica que, homens poderosos, para manter seu poder, constroem um Deus com leis que lhe assegurem tranquilidade e que atua segundo uma lógica humana, injusta, prepotente, criadora de exclusão e de marginalização.

Quem são os leprosos hoje? Quem está vivendo à margem da sociedade? Quais motivos tem levado à falta de dignidade?

Não temos que criar leis em nome de Deus, temos é que perceber como atuar para que essas pessoas sejam incluídas, aceitas e compreendidas em suas necessidades, afinal a Lei já foi criada “Amar ao próximo como a si mesmo”.

Na Campanha da Fraternidade desse ano abordaremos o tema da violência, tema bastante amplo, porém conectando com as leituras de hoje, pensemos nas violências que estão presentes em nossas vidas, a violência da falta de alimentação, da falta de moradia, da falta de emprego, da falta de segurança, da falta de educação, da falta de saúde, tudo leva para a ampla violência da falta de dignidade, é incoerente que com tantos “projetos sociais” em andamento ainda exista tanta violência, violência forçada como no caso dos leprosos das leituras.

Até quando as pessoas serão marginalizadas e excluídas por falhas de toda uma sociedade inerte diante do poder de alguns? E em nossas comunidades, como   lidamos com os excluídos da sociedade ou da Igreja? Procuramos integrar e acolher ou ajudamos na continuação dos mecanismos de exclusão e de discriminação?
Carla Matos



sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Em Jesus encontramos a cura dos males do corpo e da alma (04/02/2018)

Introdução
A liturgia deste domingo nos ajuda a refletir sobre um assunto bem atual: O sofrimento humano. O livro de Jó nos confronta com algo incompreensível a quem acredita que Deus recompensa os bons e castiga os maus nesta vida: Jó é um homem justo e, apesar disso, perdeu tudo. Durante 40 capítulos, Jó protesta contra a injustiça de seu sofrimento sem explicação, mas no fim Deus vai mostrar sua presença, e Jó se consola e se cala.

Também Jesus, no Novo Testamento, nunca apresenta uma explicação do sofrimento, porque não há explicação. Mas ele traz uma solução: assume o sofrimento. Inicialmente, curando-o. No fim, sofrendo-o, em compaixão universal. Se Jó nos mostra que Deus está presente onde o ser humano sofre, Jesus nos mostra que Deus conhece o sofrimento do ser humano por dentro. E ele o assume até ao fim.

A II leitura continua com os assuntos da Carta aos coríntios, que pretendem ter a liberdade de fazer tudo o que têm direito de fazer. Paulo não concorda: nem sempre devo fazer uso de meu direito. A caridade, a paciência para com o menos forte na fé, valem mais que meu direito pessoal.

Comentários bíblicos
I leitura: Jó 7,1-4.6-7
Jó foi fortemente provado por Deus. Perdeu tudo, até a saúde. Seus amigos não o conseguem consolar (Jó 2,11). Jó contempla sua vida com amargura e só consegue pedir que a aflição não seja demais e que Deus lhe dê um pouco de sossego. A vida é um “serviço de mercenário”, diz. Ele desperta já cansado e, deitado, não consegue descansar, por causa das feridas que o atormentam.

Procurando uma resposta para o mistério do sofrimento, os amigos de Jó dizem que os justos são recompensados e os ímpios, castigados. Mas Jó protesta: ele não é um ímpio. A teoria da prosperidade dos justos, a “teologia da retribuição”, não se verifica na realidade (21,5-6). Menos ainda o convence o pedante discurso de seu amigo Eliú, tratando de mostrar o caráter pedagógico do sofrimento (cap. 32-37). Os amigos de Jó não resolvem nada. Vendem conselhos, mas não se compadecem. Suas palavras não fazem sentido. Por outro lado, mesmo amaldiçoando o próprio nascimento, Jó não amaldiçoa Deus; ao contrário, reconhece e louva sua sabedoria e suas obras na criação: o abismo de seu sofrimento pessoal não lhe fecha os olhos para a grandeza de Deus! E é exatamente por este lado que entrará sossego na sua existência. Pois Deus se revelará a ele, tornar-se-á presente em seu sofrimento – ao contrário de seus amigos sabichões –, e essa experiência do mistério de Deus fará Jó entrar em si, no silêncio (42,1-6).

Evangelho: Mc 1,29-39
Como para preencher o que ficou aberto na I leitura, o evangelho nos mostra o Filho de Deus assumindo nossas dores. A narrativa conta o fim do “dia em Cafarnaum”, iniciado em Mc 1,21 (cf. domingo passado). Jesus continua com seus gestos e ações que falam de Deus.

No início de seu ministério, Jesus assume o sofrimento, curando-o. Mostra os sinais da aproximação de Deus ao sofredor. Sinais feitos com a “autoridade” que já comentamos no domingo passado. Ao sair do ofício sinagoga, naquele dia de sábado, Jesus se dirige a casa de Pedro, onde cura a sogra que logo se põe a servir, demonstrando assim sua transformação. Depois, ao anoitecer, quando termina o repouso sabático, as pessoas trazem a Jesus os seus enfermos. Jesus acolhe a multidão em busca de cura: novo sinal de sua misteriosa “autoridade”. Os endemoninhados, os maus espíritos reconhecem seu adversário, mas ele lhes proíbe dizer o que sabem dele (cf. domingo passado). E quando, depois, Jesus se retira para se encontrar com o Pai e os discípulos o vêm buscar para reassumir sua atividade em Cafarnaum, ele revela que a vontade de seu Pai o empurra para outros lugares. Ele está inteiramente a serviço do anúncio do Reino, com a “autoridade” que o Pai lhe deu e continua sua missão com autoridade.

No fim de seu ministério, Jesus assumirá o sofrimento, sofrendo-o. Aí, sua compaixão se torna realmente universal. Supera de longe aquilo que aparece no livro de Jó. Se este nos mostra que Deus está presente onde o ser humano sofre, Jesus nos mostra que Deus conhece o sofrimento do ser humano por experiência própria.

Assim como o livro de Jó, Jesus não apresenta uma explicação teórica do sofrimento. Neste sentido, concorda com os filósofos existencialistas: sofrer faz parte da “condição humana”. Não há explicação, mas, sim, solução: Jesus assume o sofrimento. No livro de Jó, Deus se digna olhar para o ser humano que sofre. Em Jesus Cristo, ele participa de seu sofrimento.

II leitura: 1Cor 9,16-19.22-23
Esta leitura continua com a 1ª carta aos Coríntios, abordando assunto muito especial. 1Cor 8-10 é uma unidade que trata da questão sobre se o cristão pode sempre fazer as coisas que, em si, não são um mal. Trata-se das carnes que sobravam dos banquetes oferecidos pela cidade em honra das divindades locais. Essas carnes eram, depois da festa, vendidas no mercado por “preço simbólico”. O cristão, dizem os “esclarecidos”, pode comprá-las e comê-las sem problema, já que não acredita nos ídolos. Paulo, porém, pensa diferente: a norma não é a liberdade, mas a caridade (cf. Gálatas 5,13: usemos da “liberdade para nos tornar escravos de nossos irmãos”). Se o uso de nossa liberdade causa a queda do “fraco na fé”, que tem ainda resquícios de sua tradição pagã, então devemos considerar a sensibilidade de nosso irmão.

Paulo não concorda com a pretensa liberdade dos coríntios para fazerem tudo que têm direito de fazer. Existe o aspecto objetivo (carne é carne e ídolos não existem) e o aspecto subjetivo (alguém menos instruído na fé talvez coma as carnes idolátricas num espírito de superstição; 8,7). Portanto, diz Paulo, nem sempre devo fazer uso de meu direito. E alega seu próprio exemplo: ele teria o direito de receber gratificação por seu apostolado, mas, como tal gratificação poderia ser mal interpretada, prefere ganhar seu pão trabalhando.

A gratificação de seu apostolado consiste no prazer de pregar o evangelho de graça. Paulo teria os mesmos direitos dos outros apóstolos: levar consigo uma mulher cristã (9,5), ser dispensado de trabalho manual (9,6), receber salário pelo trabalho evangélico (9,14; cf. a “palavra do Senhor” a este respeito, Mt 10,10). Entretanto, prefere anunciar o evangelho de graça, para que ninguém suspeite de motivos ambíguos. Ora, essa atitude não é inspirada apenas por prudência, mas por paixão pelo evangelho: “Ai de mim se eu não pregar o evangelho! Qual é meu salário? Pregar o evangelho gratuitamente, sem usar dos direitos que o evangelho me confere!” (9,17-18). Se tivermos verdadeiro afeto por nosso irmão fraco na fé, desistiremos com prazer de algumas coisas aparentemente cabíveis; e a própria gratuidade será a nossa recompensa, pois “tudo é graça”.

Pistas para reflexão
As leituras deste domingo estão interligadas por um fio quase imperceptível: enquanto Jó se enche de sofrimento até ao anoitecer (I leitura), Jesus cura o sofrimento até ao anoitecer (evangelho). O conjunto do evangelho mostra Jesus empenhando-se, sem se poupar, para curar os enfermos de Cafarnaum. E, no dia seguinte, o poder de Deus que ele sente em si o impele para outros lugares, sem se deixar “privatizar” pelo povo de Cafarnaum. A paixão de Jesus é deixar sair de si o poder benfazejo de Deus. Ele assume, sem limites, o sofrimento do povo. Ele sabe que isso é sua missão: “Foi para isso que eu vim”. Não pode recusar a Deus esse serviço pela salvação da humanidade.

Nosso povo, muitas vezes, vê nas doenças e no sofrimento um castigo de Deus. Mas quando o próprio Enviado de Deus se esgota para aliviar as dores do povo, como essas doenças poderiam ser um castigo divino? Não serão sinal de outra coisa? Há muito sofrimento que não é castigo, mas, simplesmente, condição humana, condição da criatura, além de ocasião para Deus manifestar seu amor. O evangelista João dirá que a doença do cego não vem de pecado algum, mas é oportunidade para Deus manifestar sua glória (Jo 9,3; cf. 11,4).

Por mais que o ser humano consiga dominar os problemas de saúde, não consegue excluir o sofrimento, pois este tem outra fonte. Mas é verdade que o egoísmo aumenta o sofrimento.

O fato de Jesus apaixonadamente se entregar à cura de todos os males, também em outras cidades, é uma manifestação do Espírito de Deus que está sobre ele e que renova o mundo (cf. Sl 104,30). O evangelista Mateus compreendeu isso muito bem, quando acrescentou ao texto de Mc 1,34 a citação de Is 53,4 acerca do Servo sofredor: “Ele assumiu nossas dores e carregou nossas enfermidades” (Mt 8,17). E, se pelo pecado do mundo, as dores se transformam num mal que oprime a alma, logo à frente Jesus se revelará como aquele que perdoa o pecado (cf. Mc 2,1-12).

Também se hoje acontecem curas e outros sinais do amor apaixonado de Deus que se manifesta em Jesus Cristo, é preciso que reconheçamos nisso os sinais do Reino que Jesus vem trazer. Não enganemos as pessoas com falsas promessas de prosperidade, que até causam nos sofredores um complexo de culpa, mas, em meio ao mistério da dor, dediquemo-nos a dar sinais do amor de Jesus e de seu Pai.
Luis Filipe Dias